Sem vernissage, Poltergat quer uma festa sem amarras em todo show.
Uma das coisas mais legais que esse ano e meio de blog me trouxe foi a troca com pessoas do meio musical. Além do pessoal das bandas, produtores, bartenders e dançarinos de front dos shows, também conheci diversos criadores de conteúdo com os quais tem rolado um intercâmbio de dicas e ideias bem enriquecedor. Um exemplo disso foi o nosso 1º Dia Da Camiseta De Banda Independente, que rolou em dezembro passado, e que não teria existido não fosse a união do Crush em Hi-Fi, Vi Shows, Hits Perdidos, Minuto Indie, Música de Menina, Rádio Minhoca, Guitar Talks, Cansei do Mainstream e de mais uma galera <3
Pois bem, uma dessas amizades/colabs nasceu no ano passado com minha indicação do disco “Pra Gente Poder Passear” para o Guitar Talks, e continua hoje com um dos idealizadores do GT, o jornalista e músico Felipe Madureira, devolvendo a gentileza e nos indicando um álbum pedrada da banda Poltergat, com direito a entrevista e tudo mais. Vai lá Maddu!
Por Felipe Madureira (Maddu)
Edição final: Joyce Guillarducci
O Poltergat é um trio natural de São Paulo que traduz muito bem o espírito caótico e por vezes pesadamente violento dessa megalópole. Mas engana-se quem acha que isso se traduz numa música “depressiva-suicida”.
Gabriel Muchon (guitarra/voz), Luis Eduardo (baixo) e Guilherme Migliavaca (bateria) tentam impor o “ritmo de festa”, não o do Silvio Santos e sim do ritmo inspirado no punk inglês com muito niilismo e altas doses de cerveja, fumaça e jams. É assim que nasceu em 2011 a trinca sonora que lançou recentemente o álbum “Blanka” (Sinewave/Howlin´ Records).
“A gente não troca muito ideia sobre o que compor ou como compor. A nossa forma de criar música é totalmente no feeling. ‘Harmonização’ mais jam (risos). Alguém começa um riff, uma levada, e a coisa vai sozinha”, explica de uma forma bem-humorada Muchon.
O músico também fala sobre como é tocar em um trio, referências na música, posicionamento político e cena musical de São Paulo. “Sei lá cara, as pessoas vão aos shows e festas como se fossem em uma vernissage”, comenta.
Leia a entrevista na íntegra e ouça o disco “Blanka” aqui:
Nos conte um pouco sobre o começo da banda.
Cara, começamos a tocar e fazer jams no final de 2011. Somos amigos há muito tempo e sempre queríamos tocar juntos, mas até 2009 estávamos tocando em bandas diferentes, deixando essa hipótese no gelo. Depois de um tempo fora, voltei pra São Paulo e resolvemos nos juntar pra curtir mesmo. Música, festa, bebida… esse tipo de coisa.
No primeiro dia que entramos em estúdio pra fazer uma jam, saiu meio que de uma vez a música “Bright Lights”, a última faixa do “Blanka”, disco recém lançado. A forma que nós fizemos essa música meio que virou a forma como a gente faz música até agora, ou seja, cerveja, fumaça e jam. A coisa vai sozinha nessas condições…
Quais as inspirações na hora de compor?
A gente não troca muito ideia sobre o que compor ou como compor. Como falei acima, a nossa forma de criar música é totalmente no feeling. “Harmonização” mais jam (risos). Alguém começa um riff, uma levada, e a coisa vai sozinha. Muitas vezes a música sai de primeira e assim fica para a eternidade.
Vocês tem uma pegada do punk inglês. Dá pra citar algumas bandas que serviram de alicerce para a sonoridade atual do trio?
Po, eu gosto demais do Punk Inglês cara. Buzzcocks, The Undertones, Stiff Little Fingers, Jam, Pistols, The Damned, Uk Subs, e claro, Joy Division e The Clash. Essa última mudou o curso da minha vida na real. Conheci reggae e ska através deles e tal… Mas em termos da sonoridade que temos, acho que Buzzcocks, Pistols e Jam são mais próximas da gente.
Além do lance 77’, o que pega pra gente é toda a bagunça, violência, urgência, identidade e eloquência do rolê de Manchester no final dos 80 e começo dos 90, com Stone Roses, Happy Mondays, The Charlatans, Oasis e Primal Scream. Não posso deixar de citar Supergrass também. PQP, a gente só queria ser que nem eles em 95.
Falando em trio, como é tocar em um – em todos os sentidos?
É a primeira vez que toco em um trio. O que posso dizer sobre isso é que a experiência é muito mais energética e crua. Não tem espaço pra firula ou preguiça, e isso reflete demais nos shows. A galera costuma se impressionar mais com o barulho que 3 caras fazem no palco. Mas tem que fazer barulho mesmo, senão fica triste demais. Ou entrega a alma lá, ou nem sobe pra tocar… That’s it..
O ritmo de São Paulo inspira o Poltergat. Fale um pouco dessa relação caótica.
Total! Tocar pra gente é se colocar à prova, bixo. É a hora que você mostra as suas cartas. São Paulo te faz fazer isso o tempo todo, ou melhor, as pessoas da cidade te fazem pensar assim. É inerente, é assim que somos aqui, é assim que funciona. Essa pressão e treta diária toda acaba extrapolando e chega no som que fazemos. É tudo ou nada mesmo. Não há espaço pra dúvida, não tem margem pra isso. Ou vai ou racha.
A banda parece ter um “q” meio niilista, tipo vamos farrear antes do final do mundo. É esse o espírito?
Hell yeah. É isso aí! Acho que todos nós temos problemas demais para ficar se lamentando na hora de fazer festa. Porra, a coisa está caminhando para um mundo cada vez mais individualista, mas tem uma coisa que todos nós temos em comum, que é querer se divertir, de curtir uma doideira, de cantar alto pra caralho a sua música favorita, dançar pelado, sei lá.
Queremos brindar isso, lembrar a todos que é essa a melhor parte da vida. Seremos sempre jovens se não nos esquecermos disso. Diversão em primeiro lugar! É disso que falamos.
“Blanka” nasceu num ano bem escroto, com crise econômica e esfarelamento total da política (Trump, Temer, Dória, Crivella). Dá pra pensar em festa com esse horizonte sombrio?
Pois é né? Ta foda isso aí mesmo cara. Mas pensa bem, quando que esteve bom? Sempre esteve uma merda. Não boto fé em político não, sempre foderam a gente. Sempre! Todos eles. Esse lance é tão deprê que simplesmente resolvemos nunca se posicionar politicamente com a banda. Pra gente 2016 foi divertido e bastante produtivo na real, “apesar da crise”. Segue a vida que a festa não pode parar não…
Fale um pouco sobre a cena musical de São Paulo.
Olha cara, não vou mentir não. Acho que está fraco pra caralho! O que eu vi com 18, 20 anos, não existe mais na capital. Aquele napalm no coração se foi há muito tempo. Até tem festa, line up legal, mas aquele espírito destrutivo que nutriu e sempre nutrirá o rolê foi trocado pela long neck de 12 conto, sem falar das selfies (olha a crise aí)…
Sei lá cara, as pessoas vão aos shows e festas como se fossem em uma vernissage. Nas outras cidades não vejo isso não, mas na capital tá foda… Acho que a molecada se interessaria muito mais pelo rap do que pelo rock hoje, e entendo o porquê. O rap de São Paulo tá animal atualmente, inclusive!
Pra terminar, como foi esse lance entre os selos de vocês, Sinewave e Howlin´ Records?
Sobre o lançamento do nosso primeiro disco, só temos à agradecer de coração mesmo a ajuda e interesse da Howlin’ e da Sinewave. A Howlin’ é nossa parceira já de longa data. Acreditaram na gente e sempre nos ajudaram na divulgação e distribuição das músicas desde o começo do Poltergat.
A Sinewave foi uma puta surpresa pra gente porque não achávamos que os caras iam se interessar (hahaha), afinal, só lançam bandas muito fodas. Ambas fazem parte desse esforço paulistano de tentar deixar a coisa viva, gerando discussão, conteúdo, shows e etc, e estão mandando muito bem na minha opinião. Valeu Howlin’ Record e Sinewave, tamo junto!
Ouça “Blanka”!